quinta-feira, julho 10, 2025
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    Explicando: a disputa do potássio no Amazonas

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    Autazes, um município localizado a 113 km de Manaus, no estado do Amazonas, tem se destacado como o detentor do maior rebanho bovino do estado, contando com cerca de 83 mil cabeças de gado. Além disso, a região tornou-se notória na última década pela descoberta de uma imensa jazida de potássio em seu subsolo, que tem sido explorada há dez anos. Em meio a tantas riquezas, Autazes enfrenta um conflito de interesses. De um lado, a necessidade de explorar os recursos da região; de outro, a defesa de direitos dos povos tradicionais do município e a proteção ambiental.

    A extração de potássio é considerada uma das principais atividades econômicas de Autazes, algo que a prefeitura local se orgulha. Na entrada da cidade, um outdoor saúda os visitantes com a mensagem: “Bem-vindo a Autazes, terra do leite e do potássio”.

    O potássio desempenha um papel indispensável na agricultura brasileira, sendo essencial para a translocação de açúcares e ácidos orgânicos em plantas, contribuindo para o amadurecimento e a acidez em frutíferas, bem como o enchimento de grãos. Devido à importância desse mineral, a descoberta de uma jazida de sais de potássio sob um município no interior da Amazônia despertou o interesse do Governo Federal, que tem apoiado a extração desde o início.

    Em 2020, o então vice-presidente da República, Hamilton Mourão, durante uma palestra na Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (FIEAM), destacou que a atividade de extração de potássio em Autazes era uma das prioridades do governo:

    “Temos que resolver e liberar a questão da exploração do potássio na região de Autazes. É fundamental, pois o Brasil importa 70% do que usa. Vamos gerar emprego e renda [com a extração de potássio]”, afirmou o vice-presidente na época.

    Benefícios da exploração de potássio

    A extração de potássio em Autazes despertou o interesse do Governo Federal por seus benefícios econômicos e sociais. As lavouras do Brasil abastecem cerca de 20% da população mundial, portanto a autossuficiência cortaria custos importantes. Outros benefícios trazidos pela atividade incluem:

    1. Segurança alimentar: O potássio é um elemento essencial para o crescimento e desenvolvimento das plantas. Sua presença na agricultura brasileira é fundamental para garantir uma produção agrícola saudável e abundante. Ao explorar o potássio localmente, o Brasil reduz sua dependência de importações, garantindo assim maior segurança alimentar.
    2. Geração de empregos: A atividade de exploração de potássio gera oportunidades de emprego direto e indireto na região. Desde a fase de extração até o processamento e transporte, há a necessidade de mão de obra especializada, o que impulsiona a economia local. De acordo com a Potássio do Brasil, a extração do mineral em Autazes gera em média, 2,6 mil empregos diretos por ano e vários indiretos na região.
    3. Desenvolvimento regional: A exploração de potássio pode impulsionar o desenvolvimento econômico regional, uma vez que atrai investimentos e estimula o crescimento de outros setores relacionados. Isso pode resultar em melhorias na infraestrutura, serviços públicos e qualidade de vida da população local.
    4. Exportações e balança comercial: A produção de potássio em larga escala pode contribuir para o aumento das exportações brasileiras. Como o Brasil importa grande parte do potássio utilizado na agricultura, explorar as reservas internas reduz a necessidade de importação e pode resultar em um saldo comercial mais favorável.

    É crucial ressaltar que esses benefícios devem ser equilibrados com a conservação ambiental e o respeito aos direitos dos povos indígenas, por meio da condução sustentável da atividade e levando em consideração os impactos sociais e ambientais. No entanto, a realidade na região é diferente.

    Riscos da exploração de potássio

    A Potássio do Brasil deu início a perfuração de poços para explorar as ricas reservas de potássio no município de Autazes em 2013. Inicialmente, o plano era utilizar os rios Amazonas e Madeira como vias de transporte para o minério extraído. No entanto, surgiram questões delicadas quando se descobriu que a perfuração estava ocorrendo dentro da Terra Indígena Jauary, território ancestral do povo Mura, e em áreas próximas a outras reservas indígenas.

    A mineração de potássio pode resultar em desmatamento, degradação do solo, contaminação dos corpos d’água e comprometimento da biodiversidade local. O uso de produtos químicos no processo de extração e a disposição inadequada de resíduos podem causar danos irreversíveis ao meio ambiente, inclusive a contaminação dos lençóis freáticos e rios com resíduos químicos.

    Isso representa um risco significativo para a qualidade e disponibilidade da água na região e afeta diretamente a saúde e a subsistência das comunidades locais, bem como a fauna e a flora aquática. Para os Mura, a perda de terras tradicionais compromete sua subsistência, cultura e modo de vida.

    Perante às questões levantadas pelos povos indígenas da região, a Justiça Federal no Amazonas já havia determinou que as placas da Potássio do Brasil fossem retiradas do território. Um acordo judicial garantiu ao povo Mura o direito legal de serem consultados livremente, de forma prévia e informada sobre as atividades de mineração.

    Pouco tempo depois, esse acordo judicial foi desrespeitado. O Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça do Amazonas que a Potássio do Brasil estaria desrespeitando reiteradamente os direitos do povo Mura, inclusive com auxílio de forças policiais locais, mas sem a devida autorização judicial.

    O MPF solicitou, ainda, a aplicação de uma multa de 100 mil reais à empresa, alegando violação dos direitos humanos. Ao mesmo tempo, indígenas do povo Mura relatam ameaças de morte no contexto dessa disputa territorial relacionada à extração de potássio na Amazônia, e o confronto não parece dar sinais de trégua.

    O que diz o MPF

    Em nota, o MPF informou que vem acompanhando de perto a situação em Autazes, e manifestou extrema preocupação diante dos relatos do povo Mura sobre ameaças de morte no contexto dessa disputa territorial relacionada à extração de potássio na Amazônia.

    Em audiência no final de abril, o MPF destacou que tomou medidas cabíveis para buscar a proteção dos direitos do povo Mura. Foi ingressada uma ação na Justiça Federal contra a União e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), com o objetivo de constituir um grupo de estudos e obter a publicação de um relatório sobre os limites e a tradicionalidade do território indígena Soares/Urucurituba, em Autazes.

    Além disso, diante do cenário apresentado, o MPF solicitou à Justiça Federal a paralisação de qualquer atividade relacionada ao projeto Potássio em Autazes que impacte o território Mura, especialmente na região de Soares/Urucurituba. Também foi reforçado o pedido de interrupção da pré-consulta ao povo Mura, uma vez que a Constituição Federal proíbe a exploração de minérios em terras indígenas.

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    Com informações da Gazeta da Amazônia*

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