O futuro das terras indígenas está nas mãos do Supremo Tribunal Federal (STF). Isso porque o governo do presidente Jair Bolsonaro não tem intenção de ampliar os territórios indígenas. O presidente fala isso desde a campanha eleitoral e até o momento sustenta sua promessa.
Nesse contexto, Bolsonaro pondera que as terras podem ser exploradas pelos próprios índios para sua sobrevivência, caso queiram.
Na última sexta-feira, Bolsonaro disse que nenhuma área foi demarcada no governo dele, conquanto haja projetos para exploração de terra indígena.
A declaração ocorreu durante a inauguração de uma planta de biogás de uma usina da Raízen, em Guariba, São Paulo.
No discurso, Bolsonaro relembrou que o presidente da França, Emmanuel Macron, pediu ampliação dessas terras. Sugeriu Macron que houvesse a ampliação de 12% para 20% de áreas demarcadas.
“Eu lembro quando passei em Osaka (Japão) e tive um encontro com o presidente de um grande país da Europa que quase sempre está na vanguarda para nos criticar”, lembrou Bolsonaro.
“Ele queria que nós ampliássemos de 12% para 20% a quantidade de áreas demarcadas como terras indígenas em meu país”, completou.
Mas, conforme o presidente, nenhuma reserva foi demarcada até o momento.
Entretanto, cada vez mais Bolsonaro luta para que o projeto do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, seja implementado.
O que diz o projeto? – “Que o índio possa, se essa for a sua vontade, explorar seu território da melhor maneira que lhe seja útil”.
Futuro das terras indígenas
E é nesse contexto em que ataques do governo federal ameaçam os direitos indígenas. Da mesma forma acontece no Legislativo. Lá, os projetos e bancadas contrários aos índios do Brasil se sobressaem.
Por outro lado, olhares e esperanças de garantir esses direitos dos povos originários se voltam ao STF.
No próximo dia 28 de outubro, o STF julga o processo de repercussão geral que discutirá a demarcação de terras indígenas no Brasil.
Nesta mesma data, a Corte Suprema discutirá se mantém ou não a medida cautelar que instituiu o marco temporal. Esse marco é considerado nocivo aos índios.
Nesse sentido, o ministro Edson Fachin, do STF, suspendeu, em maio deste ano, os efeitos do Parecer 001/2017, da Advocacia-Geral da União.
A AGU institui o marco temporal como norma para as demarcações de terras indígenas.
Ao menos 27 terras indígenas tiveram seus processos de demarcação devolvidos à Funai com base no Parecer 001. Casa Civil e Ministério da Justiça devolveram tais processos.
Fachin suspendeu também todos os processos judiciais que poderiam resultar em despejos ou anulação de demarcações até o final da pandemia.
O que será julgado no STF?
O Recurso Extraordinário 1.017.365, com repercussão geral é um pedido de reintegração de posse.
O pedido foi movido pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) contra a Funai e indígenas do povo Xokleng.
O caso envolve uma área reivindicada – e já identificada – como parte do território tradicional Xokleng.
A terra em disputa é parte do território Ibirama-Laklanõ, que foi reduzido ao longo do século 20. Na região vivem também os povos Guarani e Kaingang,
Em decisão publicada no dia 11 de abril de 2019, o plenário do STF reconheceu por unanimidade a repercussão geral do julgamento do RE 1.017.365. A decisão foi publicada no dia 11 de abril de 2019.
Isso significa que, o que for julgado nesse caso, servirá de tese de referência a todos os casos envolvendo terras indígenas. E valerá em todas as instâncias do Poder Judiciário.
Reconhecimento ou negação de direitos
Para o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), contudo, o que está em jogo é o reconhecimento ou não do direito à terra.
De acordo com o Cimi, há duas teses principais que se encontram atualmente em disputa. Uma, é a “teoria do indigenato”, uma tradição legislativa do período colonial.
Ela reconhece o direito dos povos indígenas sobre suas terras como um direito originário – ou seja, anterior ao próprio Estado.
A outra, é uma proposta mais restritiva, que pretende limitar os direitos dos povos indígenas às suas terras. Nesse contexto, trata-se do chamado “marco temporal”.
Demarcações a partir de 1988
O marco temporal é uma tese que busca restringir os direitos constitucionais dos povos indígenas.
A interpretação é defendida por ruralistas e setores interessados na exploração das terras tradicionais.
De acordo com eles, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem sob sua posse em 5 de outubro de 1988. Dessa maneira, seria o que, naquela data, estivessem sob disputa física ou judicial.
Na avaliação de indigenistas, juristas, lideranças indígenas e do Ministério Público Federal (MPF), essa é uma tese perversa. De conformidade com eles, legaliza e legitima as violências a que os povos foram submetidos até a promulgação da Constituição de 1988, em especial durante a Ditadura Militar.
Além disso, essa posição ignora o fato de que, até 1988, os povos indígenas eram tutelados pelo Estado e não tinham autonomia para lutar, judicialmente, por seus direitos. Por tudo isso, os povos indígenas vêm dizendo, em manifestações e mobilizações: “Nossa história não começa em 1988”.
Consequências do julgamento
Caso o STF reafirme o caráter originário dos direitos indígenas e, portanto, rechace definitivamente a tese do marco temporal, centenas de conflitos em todo o país terão o caminho aberto para sua solução, assim como dezenas de processos judiciais poderão ser imediatamente resolvidos.
As 310 terras indígenas que estão estagnadas em alguma etapa do processo de demarcação já não teriam, em tese, nenhum impedimento para que seus processos administrativos fossem concluídos.
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Com informações do Portal BNC*