Com as aulas interrompidas desde a segunda quinzena do mês de março, por conta da pandemia do novo coronavírus, estudantes da rede pública do interior do Amazonas tiveram que fazer um esforço ainda maior, em meio a dificuldades de logística e conexão com internet, para seguir com os estudos. Ainda sem previsão de retorno para as aulas, professores passaram a percorrer rios do Estado, desde o final de junho, para levar, de casa em casa, tarefas e lições aos seus alunos.
No Amazonas, o novo coronavírus já infectou mais de 83 mil pessoas e causou mais de 3 mil mortes, até sexta-feira (10). Com números da Covid-19 em estabilidade, o governo estadual tem flexibilizado a quarentena desde 1º de junho, e permitiu que as aulas voltem a ser presenciais apenas na rede privada de ensino, desde 6 de julho.
A rede pública de educação do Amazonas continua com as aulas presenciais suspensas em todas as cidades, tanto na rede estadual quanto municipal. Desde quando a medida foi tomada, alunos da capital e do interior do Estado têm tido acesso ao projeto ‘Aula em Casa’, do governo, que transmite aulas via satélite. Porém, estudantes de localidades mais distantes dos centros urbanos sofrem com falta de estrutura, como energia elétrica, internet, dentre outros.
Para impedir que estudantes da Escola Municipal Ademilde da Fonseca Sobral, na área rural de Presidente Figueiredo (município distante 117 Km de Manaus), fossem prejudicados com a pandemia, os professores decidiram percorrer os rios para levar atividades escolares até eles. A escola, localizada no ramal Rumo Certo da comunidade Boa União, no Km 165 da BR-174, atende cerca de 548 alunos. Desse total, 274 estudantes moram em localidades com acesso apenas fluvial.
A gestora da escola, Nanciara Cunha, explica que o corpo pedagógico reuniu conteúdos relevantes, de acordo com a série de cada turma, e imprimiu as atividades para levar até a casa dos alunos, respeitando medidas de prevenção contra à Covid-19. A primeira remessa com tarefas escolares foi entregue aos alunos no dia 24 de junho e contou com apoio de 33 barqueiros para conduzir professores e outros membros do corpo pedagógico da unidade até as casas.
“Nós entendemos que os alunos não têm culpa de estar sem a escola. Algumas pessoas têm antena rural de internet, mas a grande maioria não tem. Dentro do lago existem lugares onde ainda não têm energia elétrica, então é uma situação que comove muito a gente”, contou. Ela também destacou que são levados conteúdos para que eles possam aprender com outras pessoas, com ajuda de colegas, irmãos, familiares, dentre outros.
“Quando nós chegamos nas casas para fazer essas entregas, foi de uma emoção muito grande porque as crianças ficaram felizes em nos ver. Nós fomos muito bem recebidos, e os professores foram tomados de uma emoção muito grande porque nós vimos o quanto os alunos amam a escola”, disse Nanciara.
O planejamento dos professores é de levar as tarefas a cada 15 ou 20 dias letivos, para corrigir o material anterior e deixar as novas atividades. Ainda de acordo com a gestora da escola, os professores passam até 8 horas navegando para poder chegar até todos os alunos. A próxima remessa de atividades deve ser levada no dia 17 deste mês.
“A escola é o único lugar que eles têm ali naquela comunidade, a gente não tem uma quadra de esportes, não tem um laboratório de informática, a gente não tem uma internet pra fazer esses alunos navegarem pelo mundo. O que nós temos é só isso, a nossa boa vontade”, declarou.
Na zona rural, os professores já começaram a percorrer as calhas dos rios para visitar as mais de 25 comunidades com escolas da rede e realizar a ‘socialização’ do projeto, que têm previsão de início para o dia 27 deste mês, explicando como irá funcionar e mapeando estratégias para atender a todos os estudantes.
“A nossa estrada aqui são os rios. A maioria das escolas no interior a gente só chega pelos rios. A gente vai de barco, de voadeira, os professores vão de canoa. Então esse é o meio de transporte dos professores pra chegar a essas escolas”, disse o secretário de Educação do município, Silfarney Cruz.
O secretário explicou ao G1que moradores da zona urbana estão indo até as escolas para buscar as atividades impressas e levar até os estudantes, porém, na falta da presença do responsável, o professor é mobilizado para ir até a casa fazer a entrega do material.
“Nós estamos em uma reunião muito complicada geograficamente, principalmente no momento de seca do rio. A maioria dos professores são da própria comunidade. Então não tem muita dificuldade para se deslocar. Mas tem comunidades que não escola ainda, porque tem só duas famílias. Nesse caso, alunos não vão se deslocar, o gestor vai se deslocar até essa comunidade pra levar”, contou.
De acordo com ele, a previsão é que as aulas remotas sejam realizadas até final de agosto. Baseado nos boletins epidemiológicos, o corpo docente deve fazer um novo planejamento para a partir de setembro.
“Essa foi a alternativa mais democrática que nos encontramos, porque nem todos os nossos alunos têm acesso à internet ou celular. E nas comunidades distantes é mais difícil ainda. Essas atividades impressas vão chegar em todos os alunos matriculados na rede, mais de 8 mil alunos”, contou.
O G1 procurou a Secretaria de Estado de Educação do Amazonas para saber sobre o funcionamento das aulas via internet nas cidades do interior, e aguarda retorno.
O diretor-executivo da Associação Amazonense de Municípios (AAM), Luiz Cruz, informou que a grande maioria das cidades do interior deve acompanhar o calendário da rede estadual para retomar as aulas na rede municipal. Até esta sexta-feira (10), nenhuma cidade do Estado havia retomado as aulas presenciais na rede pública.
“A Covid-19 começou em Manaus e se espalhou, depois, para o interior. Os municípios ainda estão preocupados em conter a curva de incidência da doença e atender a população nos hospitais”, disse Cruz.
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Com informações do G1*