sábado, julho 27, 2024
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    Para a saúde mental de jovens no Amazonas: Um rivotril

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    Mariah Brandt – Coloquei uma roupa nova para ir ate a Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) na última quinta-feira (13). Sugeri aos colegas no Portal Projeta que seria importante estarmos presentes no Seminário Regional de Promoção e Defesa da Cidadania, que acontece no Brasil inteiro pela Unale (União Nacional dos Legisladores e Legislativos do Amazonas).

    Para mim, é especialmente irônico que o evento leve esse título. Mais adiante você vai entender os motivos.

    Frequento desde muito cedo reuniões institucionais e nunca achei que tivesse algo relevante o suficiente pra falar a ponto de pedir o microfone num local como a Aleam.

    Leia também:

    A imprensa de um local invisibilizado como o nosso precisa aproveitar quando se reúnem autoridades de doze estados brasileiros focados em definir medidas que solucionem questões urgentes como o Suicídio e Automutilação, Sistema Único de Segurança Pública e Violência contra Mulher.

    Como funciona?

    Profissionais de cada uma dessas áreas formaram Grupos de Trabalho que, durante a manhã inteira, fizeram exposições com informações, dados e experiências sobre os temas.

    Poderia ter escolhido ficar onde se debatia Segurança Pública, mas pensei que até então conseguimos entregar um material suficientemente completo e profissionalmente sensível sobre o tema no que diz respeito ao Amazonas.

    Por ser e sentir todos os dias a dor e a delícia que é ser mulher nesse país e nesse Estado, em que um dos municípios, Barcelos (a 405 km de Manaus), é campeão no índice de feminicídios, me inscrevi no Grupo que passaria a manhã debatendo sobre a Violência Contra Mulher.

    Mas logo após o discurso inicial do presidente da Unale, deputado Kennedy Nunes (PSD) notei que a novidade para nós era a inclusão da saúde mental: ia rolar um vasto debate sobre suicídio e automutilação na Assembleia Legislativa do meu Estado, fiquei curiosa.

    Eu tenho mais de um amigo que já tirou a própria vida. Eu tenho mais de uma amiga que busca a saída na automutilação quando nada mais pode resolver alguma situação.

    Confiei nas figuras parlamentares que são as deputadas Joana Darc (PR) e Alessandra Campelo (MDB) e na delegada Débora Mafra, que estariam no Grupo de Trabalho sobre Violência contra a Mulheres e sabia que dali viriam boas propostas para diminuir esse cenário horroroso que protagonizamos.

    Suicídio e Automutilação

    Quando vi que a professora indígena Maria Assunta era uma das expositoras, pensei: “Vai ser bom!”.

    E foi. Ela abordou processos educacionais e as complexidades em termos a maior população indígena do país aqui no Amazonas e os processos de invisibilização e eliminação desse povo, que estão acontecendo exatamente agora enquanto você lê esse texto.

    Em seguida uma deputada jovem, Catarina Guerra, de Roraima, entregou a cartilha com o tema “Prevenir Futuros Casos de Suicídio”, com a linguagem toda voltada para juventude e com uma fala simpática, otimista e postura de miss (depois descobri que ela realmente já havia sido).

    Dois profissionais do Distrito Federal também compunham a mesa. Elias Lacerda trouxe dados da Organização Mundial de Saúde, mostrando que a cada 40 segundos um suicídio ocorre no mundo. Em um recorte para o Brasil, a estatística é de que a cada 45 minutos um brasileiro tira a própria vida.

    “Eu me corto, saio na rua sem camisa e ninguém me vê”
    (Jovem, 17 anos)

    Elias exibiu em sua apresentação relatos como esses, falou sobre a atenção que é preciso ter a respeito das redes sociais e também explicou como lidar com fenômenos recentes na internet como o “Momo” que representam perigo para vida de crianças muito pequenas.

    Já a Dra. Andrea Chaves veio com inovação: vestida com o uniforme do Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), ela contou como surgiu o Núcleo de Saúde Mental dentro do órgão, inspirado em uma iniciativa de Portugal.

    “Fazemos uma intervenção em crise especializada, 80% das nossas ocorrências a gente consegue finalizar no local, evitando internações psiquiátricas. Acionamos toda a rede de segurança do paciente e garantir que no dia seguinte ele vá para o Capsi [Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil] ou vá procurar um psicólogo. Encaminhamos pra rede, orientamos a família, esclarece os processos e com isso mantemos o paciente em tratamento”

    Andrea também deixou claro que as autoridades precisam entender que as emergências psiquiátricas levam à morte assim como um trauma de trânsito. E deu exemplo de uma mãe que encontra a filha em processo de automutilação:

    “A mãe vai querer levar no psicólogo e a filha não vai, não é porque ela não quer, é porque ela não pode (…) É a mesma coisa que você falar pra alguém que acabou de sofrer um acidente de trânsito: levanta, esse carro vai pegar fogo, você precisa sair daí. Da mesma forma, não funciona”

    Outra fala importante nesse contexto foi a do Dr. Marcel Edvar, representante da Ministra Dâmares Alves, da pasta nacional dedicada a Mulher, Família e Direitos Humanos.

    O Diretor de Desafios Sociais no Âmbito Familiar exibiu um vídeo protagonizado pela atriz Luiza Brunet, que deve ser lançado como uma das estratégias do órgão para sensibilizar parentes, amigos e pessoas próximas àqueles que sofrem de depressão.

    Resultados

    Em 2018 o Amazonas registrou uma média de um suicídio a cada dois dias. No ano anterior foram 186 mortes por suicídio indígenas.

    O Amazonas recebe a partir de novembro 220 mil reais do Ministério da Saúde para a execução do Plano de Prevenção ao suicídio e Valorização da Vida.

    Das soluções apresentadas no evento a mais citada foi a regulamentação da Organizações Não Governamentais (ONGs) e a necessidade de ações entre as pastas de Educação e Saúde, já que os problemas são maiores entre os jovens e mais facilmente detectados nas escolas.

    Que ações serão essas é o questionamento que fica. O investimento vai ser alto, a demanda é grande e as respostas objetivas são poucas.

    Em entrevista ao Portal Projeta, a Dra. Mayara foi questionada acerca dos hospitais psiquiátricos e foi enfática: “Tentar incluir essas pessoas ao invés de isolar num hospital específico pra saúde mental é a principal maneira de solucionar (…) Acho que não se faz mais necessário isolar essas pessoas como era na era da ignorância, quando não se sabia sobre hanseníase, por exemplo”.

    Representação Local

    Com exceção da Professora indígena Maria Assunta e a própria mediadora da mesa, deputada Dra. Mayara, o único profissional residente no Amazonas a falar foi o mineiro Cléber Naief Moreira. Presidente da Associação Amazonense de Psiquiatria e Diretor Regional Norte da Associação Brasileira de Psiquiatria.

    Cléber se ausentou da mesa durante a fala do Dr. Elias Lacerda, que destacou a falta de comunicação entre gerações como o principal obstáculo para encontrar soluções no âmbito da saúde mental. Com dados bastante desatualizados, Naief fez uma fala bem contundente em defesa aos hospitais psiquiátricos e os diversos casos em que a internação teria salvado vidas durante sua carreira médica.

    No entanto, Dr. Naief provou que o tempo que se passa em hospitais psiquiátricos realmente afeta até mesmo a saúde mental de quem outrora foi saudável.

    Ao fim das exposições, pedi a fala para narrar episódios desumanos ocorridos em Minas Gerais, local de onde veio Naief, no Hospital Colônia de Barbacena, quando mais de 60 mil pessoas internadas morreram com descargas elétricas.

    Citei o nome do livro e autora: Holocausto Brasileiro, de Daniela Arpex. Citei também alguns episódios em que a homofobia e o colapso da saúde mental estiveram intimamente ligados.

    Contexto

    Naturalmente, fiz uma fala que não enche de carinhos e elogios o atual governo que abertamente já se declarou contrário a pauta indígena e tem realizado cortes que afetam diretamente a saúde dessa população.

    O representante do Governo Federal na mesa, Dr. Marcel Edvan, respondeu à todos os questionamentos sem a quebra do decoro. De maneira profissional e educada. E minhas críticas iam diretamente para aqueles que pagam o salário de Marcel atualmente – naturalmente, com o nosso dinheiro.

    Já Naief, resumiu todo contexto das informações e demandas de grupos vulneráveis que citei a minorias inventadas pela esquerda, numa fala típica daqueles que buscam higienizar a sociedade quanto a essas questões.

    Naiefr pelo Norte do Brasil dentro da Associação Brasileira de Psiquiatria, usou mais de uma vez as palavras: assassina e esquerdista na mesma frase. Foi aplaudido ao fim de sua fala em um auditório, onde eu era a única pessoa abaixo de 29 anos.

    Em resumo: nem a deputada Dra. Mayara, nem a deputada Therezinha Ruiz, que eram respectivamente mediadoras e coordenadoras da mesa, conseguiram que alguém levasse um rivotril, ou medicamento semelhante, que acalmasse os nervos do doutor. Em minúsculo mesmo.

    Passou-se a manhã inteira e o começo da tarde se discutindo alternativas que salvassem a vida de jovens em depressão e em automutilação. No único momento em que alguém dessa faixa etária se pronunciou – eu não faria uma fala na Assembleia Legislativa do Amazonas se ela não fosse autêntica – a resposta foi dada aos gritos em um surto psicótico de um psiquiatra que prova ser vítima da máxima: Casa de Ferreiro, Espeto de Pau.

    Que descanse em paz a sanidade dentro da Associação Amazonense de Psiquiatria.

     

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