sexta-feira, julho 26, 2024
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    Uyra Sodoma: do bodozal aos holofotes mundiais da sustentabilidade

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    A parcela conservadora da população não poderia imaginar que uma drag queen é, atualmente, um dos símbolos internacionais da preservação da Amazônia.

    Uyra Sodoma ganha vida no corpo de Emerson Munduruku. Biólogo natural de Santarém (PA) que chegou aos cinco anos de idade na capital amazonense. O profissional viveu durante seis anos o mundo da pesquisa científica da biologia, e em seguida, se encontrou na arte como plataforma de educação sobre a preservação da vida.

    “É uma experiência muito rica poder migrar através das plataformas e aprender linguagens novas. Trabalhava eu e os bichos, agora trabalho diretamente com pessoas em múltiplos contextos. Não só com ribeirinho mas também na cidade”,

    Trabalho esse que fez a personagem Uyra, sua drag monstra, ser a representação de uma árvore que anda e chama atenção da imprensa nacional e internacional. Em suas performances Uyra usa expressão corporal e facial que se complementam com a própria aparição da drag, montada com elementos encontrados na matas. Uma drag sustentável.

    Existem matérias de veículos especializados, ou não, em cultura que estampam o rosto e a arte de Uyra Sodoma. São publicações britânicasfrancesas, americanas e até nigerianas.

    Seu cartão de entrada é uma expressão que, sem usar uma sequer palavra, consegue emitir um grito universal. E esse grito inicia de maneira muito comum aos moradores de Manaus, especialmente durante esse momento que vivemos: o período da cheia.

    “Vim de Santarém pra Manaus pra morar no local que eu moro até hoje, que é um lugar que alaga. Passa um igarapé perto que de tanto lixo e tanta terra ele alaga desde aquela época. É um bodozal, né mana. nas casas mais baixas entra água, rato, lixo, entra tudo”

    A Fundação de Vigilância em Saúde (FVS) divulgou ainda em 2014 um aumento significativo nas doenças causadas por água contaminada em Manaus. Entre elas, hepatite A, diarreia, difteria, dermatoses e leptospirose. Cerca de 22 mil famílias vivem em palafitas expostas à doenças como essas. Os vizinhos e a família de Emerson entram na estatística.

    “Quando vinha chuva era um mano bora levantar tudo porque a pode a casa alagar’. Foi dessa forma que eu cresci. Hoje a minha casa é um pouco mais alta, não alaga mais. Eu cresci olhando pra isso, sofrendo com isso e eu era criança e olhava pra aquilo e era ruim, eu sentia e sabia que era ruim.”

    Dados de 2017 da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp) apontam que
    72.771 toneladas de resíduos foram coletadas por mês na capital amazonense. Não há dúvidas que a educação é a primeira e mais urgente alternativa pra gerar conscientização em relação ao lixo e suas consequências para vida em sociedade. Segundo ele, a situação do lixo entre o igarapés reflete de maneiras diversas no imaginário da população e afeta inclusive a auto estima da periferia de maneira coletiva.

    “Vira e mexe eu falava pras pessoas algo como: não joga lixo aí, mas acabava sendo entendido como aquela coisa de que sou biólogo e enfim (…) Aí eu começo a trabalhar com outras coisas, na época eu mudo de bairro, quando eu retorno e a Uyra aparece no mundo em 2016 eu começo a entender que era o ali momento de falar com as pessoas. Começo em 2018 a série ‘Mil Quase Mortos’ nos igarapés de Manaus. Foi baseada em pesquisa com informações históricas e socioambientais sobre os igarapés”, conta Emerson.

    SOBRE O TRABALHO

    A maturidade em trabalhos socioambientais e a vivência nos espaços urbanos na pele de um personagem, que também carrega a bandeira contra homofobia, confere a Emerson Munduruku uma autoridade ímpar para falar sobre lutas coletivas.

    Questionado sobre a área de atuação disponível para quem busca essas possibilidades de trabalho, Emerson enumera: “Trabalhar com conservação da vida pode ser feito através de várias plataformas, a minha é a educação e a cultura. Também é possível no espaço formal de ensino como professor, através de ONGs, projetos… Existe também a pesquisa, desenvolvendo vários caminhos possíveis. O setor privado com empresas e investimentos, a partir do terceiro setor como FAS, Idesam, Fundação Vitória Regia… São várias plataformas na sociedade, incluindo a nossa, na nossa vida pessoal, no dia a dia, pra atuar a favor da conservação da vida”.

    Quanto ao desafio do lixo na capital, Emerson acredita que o envolvimento só é possível por meio de dias mais humanos de compreensão. “Somente com o coletivo mobilizado a gente consegue enfrentar desafios como lixo na cidade, só dessa forma que a gente consegue lidar melhor com recursos naturais como a água. Toda e qualquer campanha ou iniciativa em prol do meio ambiente, independente do que seja, se ela não sensibilizar as pessoas, se elas não se sentirem co-responsáveis por aquilo, não acharem aquilo estimulante, não vai dar certo”, destaca Munduruku.

    Trabalhar com gente e meio ambiente passa por um processo que é muito simples e é a base de tudo. Qualquer iniciativa que tenha como foco a melhoria ambiental de qualquer lugar vai precisar envolver pessoas, precisa de mobilização social. Não mora uma só pessoa no meio ambiente, moram todas. E todas precisam estar 1. enxergando esse ambiente, 2. depois que enxerga: refletindo e 3. no campo atitudinal: agindo por este ambiente. Isso acontece em diferentes tempos e diferentes formas, mas é basicamente nessa sequencia: enxergar, refletir e em sequência agir.

    Estamos vivendo a Semana Mundial do Meio Ambiente, que foi criada no Brasil pelo Decreto nº 86.028, de 27 de maio de 1981. Atualmente, há pouco que se comemorar. Os avanços relacionados à proteção da Amazônia e demais áreas protegidas estão sendo ameaçados constantemente e as leis que o protegem estão sendo violadas.

    Para pessoas como Emerson, além da inteligência, do estudo e da pesquisa com a qual se envolve, elementos como a emoção são essenciais ao lidar com a causa. “A educação é
    esse campo onde eu tô agora, e é o coração da coisa. Não adianta impor taxa do lixo, não adianta impor e falar mil vezes se a pessoa não se sentir sensibilizada e estimulada pra enxergar, pensar e agir. Hoje estou aqui na mobilização de comunidades inteiras com tal objetivo e tal atividade nas comunidades, é um trabalho em rede”, finalizou.

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